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Asma

PREVENÇÃO PRIMÁRIA DA ASMA

Transcrição parcial do Gina 20241. A prevenção primária refere-se à prevenção do aparecimento da doença.

Os dados que apoiam o papel dos fatores de risco ambientais para o desenvolvimento da asma incluem um enfoque em: nutrição, alérgenos, poluentes (especialmente fumaça ambiental de tabaco), micróbios e fatores psicossociais.

Dieta materna

Não há sólida evidência quanto à ingestão de qualquer alimento específico durante a gravidez que aumente o risco de asma. No entanto, um estudo de uma coorte pré-natal observou que a ingestão materna de alimentos comumente considerados alergênicos (amendoim e leite) estava associada à diminuição da alergia e da asma nos filhos.2

A suplementação materna com ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa pode ter efeitos imunológicos no feto em desenvolvimento por meio de várias vias anti-inflamatórias. Entretanto, estudos epidemiológicos e ensaios clínicos randomizados durante a gravidez não mostraram efeitos consistentes sobre o risco de sibilos, asma ou atopia na criança.3-5

Embora níveis reduzidos de vitaminas D, E e C tenham sido associados à asma e à obesidade, os ensaios clínicos que testaram a suplementação dessas vitaminas em crianças mais velhas e adultos não mostraram melhora clínica relevante.6-8 Porém, é essencial observar o papel dessas vitaminas na dieta durante a gestação e os primeiros anos de vida, períodos em que a nutrição pode ter influência tanto no desenvolvimento da obesidade quanto no início da asma. Especificamente, a suplementação materna com vitamina D durante a gravidez — um momento importante para o desenvolvimento do sistema imunológico e dos pulmões — foi associada a um menor risco de sibilos na infância.7,8

Obesidade

Os dados sugerem que a obesidade materna e o ganho de peso durante a gestação representam um aumento do risco de asma em crianças. Uma metanálise9 mostrou que a obesidade materna na gravidez estava associada à maior probabilidade de asma presente ou sibilos; cada aumento de 1 kg / m2 no IMC materno foi associado a um aumento de 2% a 3% na ocorrência.

Amamentação

A amamentação diminui episódios de sibilos no início da vida; no entanto, pode não impedir o desenvolvimento de asma persistente. Independentemente do seu efeito no desenvolvimento da asma, a amamentação deve ser encorajada por todos os seus outros benefícios positivos.1 Um conjunto substancial de evidências sugere que o aleitamento materno está associado a um menor risco de asma infantil e de sintomas relacionados à asma.10-13

Alérgenos inalantes

A sensibilização a alérgenos aeroinalados em ambientes internos, em geral, é normalmente mais importante do que a sensibilização aos externos, no que concerne ao desenvolvimento de asma.

Enquanto parece haver uma relação linear entre exposição e sensibilização aos ácaros da poeira doméstica,14,15 a relação para o alérgeno animal parece ser complexa.16 Alguns estudos descobriram que a exposição a alérgenos de animais está associada ao aumento do risco de sensibilização a esses alérgenos e à asma e sibilância. Por outro lado, outros estudos demonstraram uma diminuição do risco de desenvolver alergia com a exposição a animais de estimação.17,18

Para crianças sob o risco de asma, a umidade, o odor de mofo e bolor visível no ambiente doméstico estão associados ao aumento do desenvolvimento de asma.19

Estratégias direcionadas a um único alérgeno não foram efetivas.

Tabagismo

Uma metanálise concluiu que o tabagismo pré-natal teve seu efeito mais forte em crianças pequenas, enquanto o tabagismo materno pós-natal pareceu relevante apenas para o desenvolvimento da asma em crianças mais velhas.20

Na atualidade acredita-se que a exposição à fumaça do tabaco possa prejudicar a saúde das pessoas até após duas gerações através do “efeito transgeracional” ou “intergeracional”. Isto pôde ser constatado após estudo de Liu et al.21 analisando 1689 pares de pais e filhos, quando constataram que as crianças são muito mais propensas a desenvolver asma (59%) se os pais foram expostos ao fumo passivo na infância, quando comparados a crianças cujos pais não tiveram exposição.

Estrudos transversais mostraram que os cigarros eletrônicos, introduzidos no mercado no início dos anos 2000, aumentam o risco de asma tanto em adolescentes quanto em adultos.22

Efeitos microbianos

A Hipótese da Higiene e a Hipótese da Microflora e a Hipótese da Biodiversidade,23 mais recentemente cunhadas, sugerem que a interação humana com a microbiota pode ser benéfica na prevenção da asma:

Há um risco menor de asma entre crianças criadas em fazendas com exposição a estábulos e consumo de leite cru do que entre crianças urbanas.24

Crianças em lares com ≥ 2 cães ou gatos são menos alérgicas do que aquelas em lares sem cães ou gatos.25

A exposição de uma criança à microflora vaginal da mãe através do parto vaginal também pode ser benéfica; a prevalência de asma é maior em crianças nascidas por cesariana do que naquelas nascidas por via vaginal.26

Medicamentos

O uso de antibióticos durante a gravidez e em bebês e crianças pequenas tem sido associado ao desenvolvimento de asma mais tarde na vida, embora nem todos os estudos tenham mostrado essa associação.27-29 Tem sido proposto que a exposição a antibióticos no período pré-natal comprometa as bactérias protetoras do microbioma, o que pode alterar a interface microbiana-mucosa normal e promover o desenvolvimento de asma.30,31

A ingestão do analgésico paracetamol pode estar associada à asma tanto em crianças como em adultos. O uso frequente de paracetamol por mulheres grávidas tem sido associado à asma em seus filhos.32

Estudos observacionais identificaram um aumento de 30% ou mais no risco de asma em crianças e adolescentes que usaram paracetamol – um analgésico e antipirético amplamente utilizado – no ano anterior ou durante o primeiro ano de vida.33-36 De forma semelhante, a utilização de paracetamol durante a gestação foi associada a um aumento de 20% a 50% no risco de asma e sibilância nos filhos.34 Mais recentemente, a presença de metabólitos de acetaminofeno no sangue do cordão umbilical foi associada, em análise multivariada, a um aumento nas chances de asma em crianças após seis anos de acompanhamento.36

Sempre que possível, evitar o uso de paracetamol e antibióticos de amplo espectro durante o primeiro ano de vida.

Psicossocial, Habitação

O meio social ao qual as crianças estão expostas também pode contribuir para o desenvolvimento e gravidade da asma. O sofrimento materno (ansiedade/depressão) que persiste desde o nascimento até a idade escolar tem sido associado a aumento do risco de a criança desenvolver asma, observando-se maior risco em famílias de alta renda.27

Crianças de famílias com baixo nível socioeconômico têm o dobro de chances de desenvolver asma aos 14 anos em comparação com aquelas de famílias de nível socioeconômico mais alto, que apresentam uma probabilidade 60% menor de desenvolver a doença.37 As precárias condições de moradia, que afetam desproporcionalmente as comunidades de baixa renda, são um fator que pode aumentar a incidência e agravar a asma, devido à maior exposição a alérgenos internos, como pragas, ácaros e fungos, além de contribuírem para o surgimento de sibilos durante a infância.7,8

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