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Asma

Resposta Tardia da Asma

MACRÓFAGOS

Os macrófagos são as principais células maduras do sistema fagocitário mononuclear, presentes em praticamente todos os tecidos e cavidades do corpo humano. Muitos surgem durante o desenvolvimento embrionário, outros se originam a partir de precursores na medula óssea, são a forma madura dos monócitos. Uma vez liberados na circulação sanguínea migram de forma contínua para os tecidos, onde se diferenciam adquirindo funções específicas de acordo com o microambiente local.1 São grandes células de vida relativamente longa que participam de respostas imunes inatas e adaptativas e desempenham, portanto, um papel crítico na defesa do hospedeiro, pois são fundamentais na proteção contra patógenos e cumprem um papel determinante na resolução da inflamação e no retorno à homeostase.2 Sua função fagocítica é a primeira forma de defesa na imunidade inata. Os macrófagos são capazes de detectar produtos de bactérias e outros microrganismos usando um sistema de receptores de reconhecimento, como os receptores Toll-like (TLRs). Esses receptores podem se ligar especificamente a diferentes componentes patogênicos como açúcares (LPS), RNA, DNA ou proteínas extracelulares.

Os macrófagos executam um papel relevante na orquestração das respostas imunológicas. Eles não apenas induzem à inflamação — um processo essencial para uma resposta imune eficaz —, mas também secretam diversos mediadores inflamatórios. Esses mediadores são responsáveis por ativar outras células do sistema imune e coordenar seu recrutamento para o local da resposta imunológica, promovendo uma defesa coordenada contra ameaças patogênicas.

Os macrófagos são as células numericamente mais abundantes na luz brônquica, tanto em indivíduos normais como em asmáticos, descendentes das células-tronco hematopoiéticas CD34+. A localização anatômica dos macrófagos alveolares (MAs) e suas funções sugerem que eles são capazes de manter a homeostase nas vias aéreas. Apresentam um conjunto diversificado de funções: por um lado eles lutam contra patógenos ativando múltiplas vias imunológicas e servem como primeira linha de defesa, enquanto, por outro, manifestam uma resposta anti-inflamatória para proteger o dano excessivo dos tecidos. Essa resposta anti-inflamatória é observada em vários estudos também em asmáticos. Estas mesmas células liberam uma grande variedade de mediadores que induzem à inflamação e remodelamento, incluindo enzimas (lisozima, colagenase e elastase), eicosanoides (leucotrienos LTB4 e LTC4) e fatores de crescimento.3

São três as classes de macrófagos identificadas no tecido pulmonar: macrófagos brônquicos (MBs), macrófagos alveolares (MAs) e macrófagos intersticiais (MIs). Os MBs são isolados no escarro induzido,4,5 enquanto que os MAs são encontrados na luz dos alvéolos, atuando no mecanismo de defesa inato inespecífico. Os MIs desempenham funções imunológicas importantes, incluindo a manutenção da homeostase pulmonar e a prevenção da inflamação alérgica das vias aéreas mediada pelo sistema imunológico,6-8 inclusive como células apresentadoras de antígenos.9 Entretanto, em contraposição com as células dendríticas, a captação de antígeno pelo macrófago durante as respostas imunes primárias não induz a uma resposta humoral acentuada.

Os macrófagos infiltram a mucosa brônquica e apresentam marcadores de membrana dos monócitos, pois são monócitos que migraram para os tecidos. A proteína quimiotática dos monócitos (MCP-1) tem um papel significativo no recrutamento de monócitos para o tecido onde há inflamação, onde eles se diferenciam em macrófagos.10 Expressam em pacientes com asma muitos marcadores de superfície, detectados por citometria de fluxo, incluindo CD11c, CD14, CD16, CD18, CD32, CD44, CD86, CD163, CD206, antígeno leucocitário humano (HLA) Classe I, e os HLA Classe II – HLA-DR e HLA-DQ.11-13  Existe maior expressão de marcadores CD206 e CD163 associada à asma severa e ao remodelamento das vias aéreas.14-16

Normalmente os MBs são células com poucas características de células apresentadoras de antígenos (APCs), e suprimem as respostas proliferativas das células T, possivelmente via liberação de citocinas, como o antagonista de receptor IL-1ra. Na asma, entretanto, existem fortes evidências de redução desta ação após exposição a alérgenos,17,18 encontrando-se reduzida a expressão do IL-1ra no epitélio das vias aéreas.19 Tanto o GM-CSF como o IFN-γ aumentam a habilidade dos macrófagos em apresentar alérgenos e expressar HLA-DR.20 A IL-1 cuja fonte principal nas vias aéreas é o macrófago, induz à secreção de muco, é fundamental na ativação de linfócitos T, e é um importante coestimulador da expansão de células Th2 pós-apresentação de antígenos.21 Os MBs podem se constituir em uma importante fonte de citocinas, como a IL-1, o TNFa e a  IL-6, que podem ser liberadas após exposição aos alérgenos via receptores IgE de baixa afinidade (FceRII). Estas citocinas podem atuar sequencialmente sobre  as células epiteliais que passam a liberar outras citocinas como GM-CSF, IL-8 e RANTES, as quais por sua vez amplificam a resposta inflamatória, conduzindo ao influxo de outras células  como os eosinófilos, os quais também passam a liberar múltiplas citocinas. Produzem ainda altos níveis de óxido nítrico (NO).

Por outro lado, a produção de IL-10 pelos macrófagos pode ser considerada um agente importante na resolução da inflamação. As Tregs, sob influência da IL-10, adquirem a capacidade de suprimir respostas inflamatórias extremas, ajudando a manter a homeostase imunológica.22

Tanto os MAs como os MBs que atuam como células apresentadoras de antígenos (APCs) exibem receptores de membrana que se ligam à IgG e IgE interagindo desta forma com os alérgenos, ativando-os e liberando mediadores.23 Secretam mediadores na inflamação aguda como o TXA2, PGE2, PAF, LTB4, LTD4, 5-HETE, ânion superóxido (SO) e a IL-6 após teste de provocação alérgica.17 Na inflamação crônica secretam citocinas como a IL-1, IL-8, IL-10, TNFa, MIP-1a,  GM-CSF, PDGF (platelet-derived growTh factor), EAF (eosinophil-activating factor) e IFN-γ.24

A IL-10 é um fator inibidor de citocinas com ação inibitória sobre a inflamação. A IL-10 é produzida pelos linfócitos B e Th1 e Th2,25,26 pelas células dendríticas, monócitos e pelos macrófagos, sua fonte principal nas vias aéreas.27 A IL-10 atua inibindo a produção de citocinas por fagócitos mononucleares, células natural killer e linfócitos Th2. Uma deficiência relativa na produção de IL-10 foi observada em macrófagos alveolares de pacientes asmáticos atópicos.28-30 Observações sugerem que a baixa produção de IL-10 pelos macrófagos em asmáticos possa permitir maior liberação de citocinas pró-inflamatórias, contribuindo desta forma para a inflamação das vias aéreas destes pacientes. Calhoum et al.31 acreditam que ocorra uma deficiência seletiva de IL-10 em asmáticos, pela baixa produção desta citocina pelos macrófagos e que o GM-CSF participe desta downregulation. Esta anomalia é encontrada somente em asmáticos alérgicos, estando a produção de IL-10 preservada ou mesmo aumentada em pacientes com rinite alérgica. Outra possível participação dos MAs na asma é a sua participação na fibrose subepitelial peribrônquica, com atuação no remodelamento brônquico.32

Os MAs facilitam o recrutamento de neutrófilos ativados para o espaço alveolar.33 Os neutrófilos ativados têm um tempo de vida inflamatório curto, pois são programados para se submeterem à apoptose constitutiva dentro de poucas horas após a ativação.34 Os neutrófilos apoptóticos são reconhecidos e fagocitados pelos MAs.35 Este processo em si ajuda a resolver a inflamação pulmonar, primeiro evitando o derrame de conteúdos intracelulares neutrofílicos tóxicos e, em segundo lugar, induzindo à produção de IL-10. Ao limpar os restos celulares de maneira ordenada, os macrófagos evitam a perpetuação da inflamação, uma vez que células mortas podem liberar conteúdos inflamatórios se não forem eliminadas adequadamente.

No entanto, a eferocitose prejudicada pode resultar na persistência dos neutrófilos e contribuir para o fenótipo da asma neutrofílica. A capacidade eferocitótica dos macrófagos das vias aéreas superiores e inferiores está reduzida na asma, particularmente em indivíduos com asma não eosinofílica.36-38 A downregulation de CD16 e CD64 foi observada em MBs isoladas de indivíduos asmáticos, em comparação com indivíduos saudáveis. O CD16 e o CD64 medeiam a atividade fagocítica dos MBs, a sua fraca expressão resulta em comprometimento da atividade fagocitária dos MBs.39,40

Em 2020, Hume et al. utilizando o método de estereologia design-based quantificou MAs (por ele denominado de Macrófagos dos espaços Aéreos) e MIs no tecido pulmonar a um nível de precisão não disponível anteriormente. Além da quantificação geral de MAs e MIs, os autores discriminaram ainda mais os macrófagos quanto à localização específica no tecido. Por exemplo, dos macrófagos localizados no 'espaço aéreo', 95% se situavam nos espaços alveolares, enquanto 5% nas vias aéreas.41 Os MAs são facilmente recuperáveis dos espaços aéreos via LBA e, portanto, têm sido bem estudados.42 Os MIs foram divididos naqueles que ocupam os septos alveolares com agrupamentos menores identificados em torno de vasos e vias aéreas, respectivamente. A densidade tecidual local dos MIs é maior nos septos alveolares (78%), sendo que os MIs também são facilmente localizados nas proximidades das pequenas vias aéreas, 14% em torno de pequenos vasos e 7% em torno das vias aéreas.

A autofagia tem sido implicada no desenvolvimento e progressão da asma e exibe papeis protetores e prejudiciais tanto na inflamação quanto na remodelação alérgica das vias aéreas.43 Autofagia é um processo celular pelo qual as células digerem partes de si mesmas para reciclar componentes danificados ou obsoletos e obter energia em momentos de estresse ou privação de nutrientes, desempenhando um papel importante na manutenção da homeostase metabólica dentro das células.44

Os macrófagos são células imunes inatas e desempenham um papel crítico na vigilância imunológica e no desenvolvimento de respostas imunes inatas e adaptativas na asma.16 Alguns estudos sugerem que a autofagia nos macrófagos pode afetar a resposta imunológica nas vias aéreas. Quando a autofagia está desregulada, os macrófagos podem liberar sinais inflamatórios que podem agravar a inflamação e a resposta imunológica nas vias aéreas, contribuindo para os sintomas da asma.

Por outro lado, a autofagia também pode ter um efeito positivo, pois ajuda a eliminar resíduos celulares e reduzir a inflamação excessiva. Portanto, o equilíbrio adequado da autofagia nos macrófagos é crucial para modular a resposta imunológica nas vias aéreas e possivelmente influenciar o desenvolvimento e a gravidade da asma. Essa modulação é importante. Macrófagos com fenótipos distintos são detectados em pacientes com asma, p. ex.: os M1 secretam fatores pró-inflamatórios que agravam a inflamação e o dano tecidual; enquanto os macrófagos M2c exibem efeito anti-inflamatório e imunossupressão devido à maior expressão de IL-10 e iniciam a resolução da inflamação e o reparo tecidual das vias aéreas pela liberação de IL-10.45

Em resumo, a autofagia dos macrófagos desempenha um papel complexo na asma, afetando a resposta imunológica e a inflamação nas vias aéreas. A compreensão desses mecanismos pode levar a novas abordagens terapêuticas para o tratamento da asma, visando a modular a autofagia para melhorar o controle da inflamação e dos sintomas.


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