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Asma

TRATAMENTO DA ASMA NA GRAVIDEZ

A causa mais comum de piora no controle da asma na gravidez é determinada pela redução ou mesmo pela completa interrupção da medicação por receio de prejudicar o feto.

A gravidez deve ser uma indicação para se otimizar o tratamento e maximizar a função pulmonar com o objetivo de reduzir o risco de exacerbações da asma.

Uma crise de asma grave representa mais risco para o feto do que o uso de medicamentos para a asma devido à redução potencial no suprimento de oxigênio para o feto.

A asma durante a gravidez pode resultar em aumento da letalidade materna perinatal,1 prematuridade e retardo no crescimento intrauterino, com baixo peso do recém-nato.2 Bahna e Bjerkdal3 encontraram aumento significativo de partos prematuros e baixo peso fetal em 381 pacientes com asma em comparação a 112.530 grávidas não asmáticas. A asma materna está associada a riscos aumentados de pré-eclâmpsia,4 diabetes gestacional,5 cesariana,5 mortalidade perinatal (impulsionada por morte neonatal)6 e hospitalização neonatal ao nascer.6

Uma pesquisa que englobou 1.739 gestantes com menos de 26 semanas de gravidez, classificou a gravidade da asma nas participantes em três categorias – "leve", "moderada" e "grave". Os resultados revelaram um aumento nas exacerbações durante a gestação conforme a asma se tornava mais grave. Das participantes categorizadas como "grave", 51% apresentaram exacerbações, em comparação com 25,7% na categoria "moderada" e 12,6% na "leve" (p <0.001).7 A morbidade da asma foi semelhante, independentemente de as pacientes terem sido classificadas como moderadas ou graves pelos sintomas e espirometria ou pela necessidade de medicação. Esses achados destacam que mesmo mulheres com asma leve estão suscetíveis as exacerbações durante a gravidez.7

Se a asma for bem controlada durante toda a gestação haverá pouco ou nenhum risco de complicações materno-fetais. A consulta regular da gestante com asma deve ser efetuada a cada quatro semanas.8 A asma está associada à comorbidades, particularmente comuns em pacientes com asma de difícil controle e a fatores de riscos comuns como obesidade e tabagismo que também complicam a gravidez.

A não adesão à medicação habitual durante a gravidez é um problema clínico relevante. Gestantes asmáticas tendem a reduzir (ou descontinuar) o uso de medicamentos para asma logo no início da gravidez. Um estudo transversal de Al Ghobain et al. investigou a opinião de gestantes com asma e detectou que 46,8% das mulheres grávidas asmáticas pararam (ou expressaram o desejo de parar) seus medicamentos para asma durante a gravidez e 48% acreditavam que a medicação para asma poderia prejudicar os seus bebês.9 Isso levou a maior número de exacerbações em uma parcela da população de outro estudo.10 A maior preocupação é principalmente quanto aos corticoides, que por falta de informação suspendem. Mesmo quando instruídas a prosseguir hesitam em continuar por medo de causar efeitos indesejáveis ao feto, quando ao contrário, a asma mal tratada por falta de informações confiáveis traz piores consequências materno-fetais. Uma coorte de 4.344 gestações encontrou um risco aumentado de malformações congênitas, sendo 398 (9,2%) bebês com pelo menos 1 malformação e 261 (6,0%) com anomalia congênita maior. As prevalências totais de malformações foram de 12,8% e 8,9% respectivamente, para mulheres que tiveram e aquelas que não tiveram exacerbação de asma. A razão de chances (OD) ajustada para todas as malformações foi de 1,48 (IC 95%, 1,04–2,09) ao comparar mulheres que tiveram exacerbações àquelas que não tiveram.11

Em razão disso, uma estreita colaboração entre obstetras e pneumologistas deve ocorrer, contribuindo para atenuar possíveis complicações.

A idade da mulher tem impacto importante na sua capacidade de conceber e também na própria gravidez, ocorrendo maior risco de asma não controlada e exacerbações, à medida que a idade progride. Estatísticas apontam que o risco de aborto espontâneo — uma perda gestacional antes da 22ª semana de forma involuntária12 — aumenta rapidamente na população geral após os 35 anos de idade, sendo que Blais et al. relataram que na asma mal controlada o risco de abortamento aumentou 26% em comparação às mulheres com asma bem controlada.13

É descrito que as mulheres com exacerbações de asma são três vezes mais propensas a ter um bebê com baixo peso ao nascer em comparação às mulheres asmáticas sem exacerbações,14 sugerindo que a prevenção de exacerbações durante a gravidez também pode levar a melhores resultados perinatais.

O tratamento da asma durante a gravidez não apresenta modificações significativas em relação à conduta habitual, porém merece algumas considerações. Como o curso da doença se modifica em dois terços das mulheres durante a gestação, recomenda-se a avaliação mensal dos sintomas da asma com a execução de teste de função respiratória. A espirometria deve ser efetuada já na primeira consulta. Para a monitoração de rotina, nas visitas subsequentes, aceita-se a execução do pico de fluxo expiratório (PFE). A avaliação seriada fetal por ultrassom com doppler deve ser iniciada na 32ª semana de gestação nas pacientes com controle irregular e para aquelas com asma moderada e severa. O controle por ultrassom é sempre recomendado após a recuperação de severa exacerbação.

Os corticoides inalatórios (CI) em doses baixas e médias podem ser utilizados durante a gravidez. Os CIs não apresentam efeitos adversos importantes ou riscos de malformações, sem consequências no parto ou no peso fetal.15 O dipropionato de beclometasona é o corticoide mais estudado na gravidez, sendo seguro, não determina alterações perinatais.16 Um estudo mostrou que beclometasona >1.000 µg.dia-1 estava associada a um risco muito pequeno de malformação congênita.17 Há quase duas décadas o FDA aprovou a mudança de classificação durante a gravidez para a budesonida, da Categoria C para a Categoria B, baseado em dados da Swedish Medical Birth Registry.18 Desta forma, na ocasião a budesonida passou a ser o único corticoide por inalação na Categoria B, constituindo-se no mais apropriado para uso em pacientes que necessitem de iniciar o tratamento com CI durante a gravidez. Na atualidade o CI nas doses usuais baixas/moderadas não foi associado a maior risco de malformação, retardo do crescimento intrauterino, parto prematuro ou baixo peso ao nascer. No entanto, sua utilização no primeiro trimestre em doses >1.000 µg.dia-1 equivalente a beclometasona, pode estar associado a um pequeno aumento para risco de malformações.17

Em 2000 ocorreu a atualização do National Asthma Education Program Working Group de 1993, chancelada pela American College of Allergy, Asthma and Immunology (ACAAI) e pelo American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG). Neste Working Group decidiu-se que pacientes que já faziam uso de CIs antes da gravidez poderiam manter a droga em curso, devido às similaridades com a budesonida no que concerne ao perfil terapêutico e efeitos colaterais. Publicações posteriores demonstraram a eficácia e boa tolerabilidade do acetonido de triancinolona19 e do propionato de fluticasona20 que podem ser utilizados por pacientes que requeiram altas doses de corticoides inalados. Os CIs reduzem o risco de exacerbações de asma durante a gravidez e a sua interrupção pode se constituir em um fator de agravamento da doença.

Nas Tabelas 1 a 5 são apresentadas as categorias das classificações de riscos dos medicamentos mais utilizados na asma durante a gravidez/lactação segundo a Therapeutic Goods Administration (TGA) e o Food and Drug Administration (FDA). Um resumo dos principais medicamentos e os possíveis riscos em cada fase da gravidez e na lactação.

Se houver necessidade de utilização de corticoides por via oral ou sistêmica, as doses devem ser semelhantes às usadas fora da gravidez, devendo-se dar preferência à prednisolona que é amplamente metabolizada pelas enzimas da placenta, pois somente 10% chegam até o feto, fazendo com que este seja o corticoide oral de escolha durante a gravidez.21 Deve-se evitar a dexametasona22 e a betametasona que atravessam a placenta de forma rápida, apresentam uma meia-vida de 36–54 h comparada com 2,5–3 h para a prednisolona23 e podem induzir à supressão das suprarrenais do feto. 

Alguns estudos relatam aumento no risco de pré-eclampsia, abortamento, fetos natimortos, malformações congênitas e efeitos adversos sobre o feto ou morte neonatal atribuídos ao uso de corticoides no decurso da gravidez.24-27 Um estudo encontrou associação significante entre o uso de corticoides por via sistêmica, no primeiro trimestre da gravidez e o aumento da incidência de lábio leporino com ou sem fenda palatina (o risco na população geral é 0,1%; com o corticoide oral é de 0,3%).25 Os autores concluíram que o uso de corticoides por via oral, no primeiro trimestre, deve se restringir a situações de alto risco de vida ou doenças sem qualquer outra alternativa segura de tratamento. Os efeitos adversos maternos durante o tratamento com corticoides incluem maior risco de infecções, reduzida tolerância à glicose e aumento do diabetes gestacional.

Outro estudo abrangendo 824 mulheres grávidas com asma e 678 mulheres grávidas sem asma demonstrou que a utilização de corticoides está associada à maior incidência de pré-eclampsia.26 Outras publicações, entretanto, demonstram que a asma severa e as exacerbações da asma não são tão bem controladas sem os corticoides,27 sendo a asma mal controlada um grande risco tanto para a mãe quanto para o feto. Portanto, o uso de corticoides por via oral durante a gravidez, quando necessário, não deve obviamente ser suspenso.

Quanto à utilização dos antagonistas de receptor de leucotrienos (LTRA), tanto o montelucaste quanto o zafirlucaste, podem ser utilizados somente em asma de difícil controle em pacientes que comprovadamente se beneficiaram de sua utilização antes da gravidez.28 Não há dados durante a amamentação, visto que a excreção no leite materno é muito baixa.29

Para os anti-histamínicos preferir loratadina e cetirizina que apresentam perfis de segurança mais extensos,30,31 embora um estudo de coorte nacional realizado na Dinamarca baseado em registro, tenha concluído que o cloridrato de fexofenadina durante a gravidez não parece estar associado a risco aumentado de desfechos fetais adversos.32,33

Os ß2-agonistas devem ser utilizados por via inalatória devido ao rápido início de ação, poucos efeitos colaterais e principalmente pelos baixos níveis plasmáticos, ao contrário do que ocorre, com a utilização parenteral e oral. Os por via oral causam mais taquicardia, hipoglicemia e tremor. Os ß2-agonistas não apresentam efeitos sobre a circulação uteroplacentária. Altas doses devem ser evitadas no período que antecede ao parto, devido aos efeitos da droga sobre os receptores ß2 do miométrio uterino, inibindo sua contração e retardando o trabalho de parto.34,35 A administração parenteral (vias venosa e subcutânea) está associada à hipotensão arterial34 e isquemia cerebral.36 Pode ser observada hipoglicemia neonatal, especialmente em prematuros, quando altas doses de ß2-agonistas forem administradas nas últimas 48 horas antes do parto. Se doses elevadas de ß2-agonistas de curta ação (SABA) foram administradas durante o trabalho de parto, os níveis de glicose devem ser monitorados no recém-nascido nas primeiras 24h.34 Para se evitar hipóxia fetal é importante tratar as exacerbações severas da asma de forma intensiva durante a gravidez com SABA, oxigênio e administração precoce de corticoides sistêmicos.

Por segurança, a GINA não recomenda mais o uso regular de SABA isoladamente na asma, isto é, em monoterapia. Esta decisão se baseou na evidência de que o uso de SABA isolado aumenta o risco de exacerbação grave e que a adição do CI reduz esse risco.38 A estratégia atual é: o SABA que pode ser usado como terapia de alívio, mas sempre em conjunto com CI de manutenção e a opção preferencial sugerida pela GINA com a combinação — CI com um LABA em um único dispositivo (p. ex. budesonida e formoterol) em doses baixas quando necessário. Durante o trabalho de parto e no parto os medicamentos usuais habituais para controle devem ser tomados com a medicação para alívio se necessário. Exacerbações não são frequentes nem no trabalho de parto nem no parto, mas podem ocorrer devido à hiperventilação, sendo tratadas com SABA.

Os perfis farmacológicos e toxicológicos dos ß2-agonistas de curta ação (SABAs) e dos ß2-agonistas de longa ação (LABAs) são análogos e os perfis de segurança dos LABAs se assemelham aos do salbutamol. Na atualidade já se dispõe de vários LABAs para serem prescritos no tratamento da asma, mas somente dois com dados de segurança suficientemente avaliados para utilização na gravidez: o salmeterol e o formoterol.39 Dados de segurança na gravidez em humanos faltam para os LABAs mais recentes — olodaterol, vilanterol (C), carmoterol e indacaterol (C) — mas os benefícios potenciais podem justificar o uso das drogas em mulheres grávidas apesar dos riscos potenciais. Nunca usar um LABA isoladamente, somente em combinação fixa com CI, associação cujos benefícios superam quaisquer riscos relatados.

A terbutalina até 2011 era qualificada pelo FDA como classe B, enquanto todos os outros ß2-agonistas são classificados como C, incluindo-se os broncodilatadores de longa ação salmeterol (seguro na gravidez) e formoterol, indicados em pacientes com asma de moderada a severa que demonstraram boa resposta à droga antes de engravidar. Admite-se também o seu uso em pacientes mal controladas com doses medianas de CIs.29 Agora a terbutalina é classificada como C. Esta mudança foi em decorrência às reações adversas graves, incluindo aumento da frequência cardíaca, hiperglicemia transitória, hipocalemia, arritmias cardíacas, edema pulmonar, isquemia miocárdica e morte, após a sua administração oral ou injetável em mulheres no tratamento e prevenção do parto prematuro.

Embora não seja um medicamento recomendado para o tratamento da asma na gravidez, não há contraindicação para a utilização da teofilina quanto à má formação e mortalidade fetal, podendo ocorrer agravamento dos sintomas digestivos de náuseas, vômitos e refluxo gastresofágico. Se houver indicação para a sua utilização os níveis plasmáticos preconizados devem ser menores que o habitual, oscilando entre 5–12 µg.mL-1 devido à menor ligação às proteínas. Como os ß2-agonistas a teofilina inibe as contrações uterinas, provavelmente pelo aumento da AMPc e no feto determina taquicardia e irritabilidade.40

O omalizumabe, um anticorpo monoclonal IgG1 humanizado contra a IgE, recebeu classificação B1 pelo FDA, pois não foram observados efeitos teratogênicos da droga em estudos animais. Deve-se observar que o FDA está eliminando o sistema de categorias. Entre os estudos de segurança do medicamento, o FDA exigiu um resultado de gravidez pós-comercialização, bem como contagens de plaquetas neonatais, devido aos achados de trombocitopenia em primatas não humanos.41 Em 2015 foi publicado um estudo de 160 recém-natos cujas mães utilizaram o omalizumabe durante a gravidez. A medicação foi utilizada em pacientes com asma moderada/severa que não se apresentavam adequadamente controladas com CIs. A maioria das mulheres monitoradas na avaliação utilizou a droga durante o primeiro trimestre, com média de utilização de 8,8 meses. As crianças nasceram com idade gestacional média de 38,3 semanas com taxa de partos prematuros de 14,5% e 3,2% dos fetos apresentaram baixo peso ao nascer. No estudo 20 lactentes tiveram anomalias congênitas confirmadas, 7 (4,4%) das quais apresentaram 1 anomalia maior.42

Quanto aos inibidores de interleucina-5 (IL-5) e de seu receptor (IL-5Rα) e interleucina-4/IL-13, estudos em animais não conseguiram revelar evidências de dano fetal em doses até 30 vezes à dose humana máxima recomendada para o mepolizumabe. Esta droga atravessou a barreira placentária em modelos animais e se prevê que tenha seu maior efeito durante o segundo e terceiro trimestres.43 Não há estudos controlados na gravidez humana, portanto, devem ser utilizados com cautela e supervisão durante toda a gravidez. Para monitorar os resultados das mulheres grávidas expostas a estes medicamentos foi estabelecido um registro de gravidez. Estudos em animais não mostraram evidências de aumento da ocorrência de dano fetal. O tratamento com anticorpos monoclonais anti-IL-5 não tende a ser um problema no início da gravidez, pois a transferência placentária de mabs tende a ocorrer somente a partir do terceiro trimestre, quando potencialmente poderá causar a depleção de eosinófilos no recém-nascido, cujo monitoramento deverá ser considerado. Quanto ao reslizumabe, em estudos com animais, este medicamento não apresentou teratogenia e não teve efeitos no desenvolvimento fetal até 4 meses de idade. Também não se dispõe de dados controlados na gravidez humana. Não se sabe se este medicamento pode causar danos ao feto ou afetar adversamente a capacidade reprodutiva em seres humanos. As novas drogas do grupo de anticorpos monoclonais mepolizumabe (categoria: B), benralizumabe (categoria: B), dupilumabe (categoria: B) e reslizumabe (categoria: não atribuído) ainda carecem de dados de segurança no que concerne à fertilidade. É improvável que os anticorpos monoclonais atravessem a placenta em quantidades suficientes para causar dano fetal e devem ser continuados durante a gravidez se necessário para o controle da asma na mãe.33

Antibióticos podem ser usados para o tratamento das exacerbações devido às infecções. O FDA classificou algumas substâncias como seguras, sendo as mais utilizadas: amoxicilina (A) (B), amoxicilina + clavulanato de potássio (B1) (B), eritromicina (A) (B), azitromicina (B1) (B) e a claritromicina (B3) (C). Entretanto, a amoxicilina pode estar associada às fissuras labiais e palatinas (risco muito baixo).44 A amoxicilina + clavulanato de potássio não é recomendada em paciente com risco de pré-parto (risco muito baixo de enterocolite necrosante no feto).45 Um estudo epidemiológico sugere risco (muito baixo) de estenose hipertrófica em crianças expostas a macrolídeos durante os primeiros 13 dias de amamentação (não após 2 semanas).46 As cefalosporinas (B1) (B) podem também ser empregadas. Estudos em humanos concluíram que a cefuxroxima (e outras cefalosporinas) em doses terapêuticas usuais não são teratogênicas. As quinolonas podem estar associadas a danos na cartilagem fetal após estudos com animais, mas os dados em humanos sugerem baixo risco.47 Se uma quinolona for necessária durante a gravidez, ressalte-se que é uma droga que a maioria dos médicos tenta evitar na gestação e lactação, o ciprofloxacino (B3) (C) deve ser escolhido.32

As mulheres grávidas parecem ser particularmente mais propensas aos efeitos das infecções respiratórias virais, inclusive a gripe, do que as mulheres em idade reprodutiva que não estão grávidas.48 Infecções virais respiratórias são relatadas como uma causa significativa de exacerbações de asma durante a gravidez49 e podem estar associadas a desfechos adversos para o recém-nato como baixo peso ao nascer e aumento da mortalidade perinatal e para a mãe (pré-eclampsia).50 A vacina contra a gripe é recomendada para mulheres grávidas devido ao maior risco de desenvolver as complicações da gripe. É um procedimento seguro em qualquer trimestre da gravidez, com o benefício adicional de proteger o recém-nascido da gripe nos seus primeiros meses de vida por imunização passiva.51

As vacinas COVID-19 oferecem às gestantes melhor proteção contra a doença que pode ser grave na gravidez a algumas mulheres. Mulheres grávidas que têm infecção sintomática COVID-19 têm 2 a 3 vezes mais chances de um parto prematuro. A vacinação COVID-19 é recomendada para gestantes, aquelas que pretendem engravidar agora ou que possam engravidar no futuro e mesmo na amamentação. Ou seja: todas as pessoas elegíveis, incluindo grávidas, amamentando, tentando engravidar agora ou que possam engravidar no futuro, devem receber uma  dose de reforço e manter-se em dia com suas vacinas COVID-19.52,53

A sinusite, um conhecido gatilho para a asma, tem tem sido relatada como sendo seis vezes mais comum em grávidas do que em mulheres não grávidas.54 Por outro lado a pneumonia é cinco vezes mais frequente em mulheres asmáticas do que em não asmáticas durante a gravidez.55

Uma revisão Cochrane de estudos randomizados e controlados determinou que não havia evidência suficiente de que a vacinação pneumocócica materna reduz o risco de infecção infantil por pneumococo.56 No que concerne à vacina contra o pneumococo a pneumocócica polissacarídica 23 valente (VPP23) – contém 23 sorotipos do S. pneumoniae – está indicada para gestantes com fatores de risco para doença pneumocócica, p. ex. diabetes (mas não diabetes gestacional), pneumopatias, assim como outras doenças crônicas, sendo sua efetividade superior a 60%.57-59 A vacina pneumocócica conjugada 13-valente (VPC13) é recomendada para mulheres em idade reprodutiva em certas condições, incluindo a infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) e asplenia. A vacina pneumocócica conjugada 13-valente (VPC13) deve ser adiada em mulheres grávidas, a menos que ela esteja em risco e os benefícios da vacinação superem os riscos potenciais.57,59

As recomendações farmacológicas para o tratamento da exacerbação da asma gestacional que necessita de hospitalização são semelhantes aos procedimentos habituais, destacando-se a exigência da oximetria de pulso. A saturação de oxigênio (SpO2) menor que 95% na oximetria de pulso reflete uma PaO2 menor que 60 mm Hg, levando à hipóxia fetal. Sempre que o PFE for menor que 200 l/min ou VEF1 menor que 1 litro está indicada a realização da gasometria do sangue arterial. A PaO2 deverá ser mantida sempre acima de 70 mm Hg ou a oximetria de pulso ≥ 95% e, se necessário, a suplementação de oxigênio por cateter nasal ou máscara facial deverá ser instituída. A hidratação é muito importante no tratamento da asma aguda na gravidez, mantendo-se hidratação venosa inicial em no mínimo 100 ml/h.  A monitoração fetal é recomendada sempre que houver asma aguda severa.

Em qualquer situação de emergência, o oxigênio deve ser prescrito às pacientes em crise, mantendo-se a saturação de O2 entre 94–98% prevenindo-se a hipóxia materno-fetal. Sempre que se solicitar gasometria durante a gravidez, levar em conta os efeitos do que se chama progesterona-driven, com aumento da ventilação minuto, que conduz à relativa hipocapnia e alcalose respiratória com alta PaO2 porém, sem alterar a SpO2.

A conduta no tratamento da asma durante o trabalho de parto permite a utilização de sprays de corticoides. Aquelas que fazem uso de corticoide oral, com doses superiores a 7,5 mg/dia de prednisolona, por mais de duas semanas, devem receber corticoides por via parenteral – "stress dose" – durante o trabalho de parto ou até que possam reiniciar a medicação oral.

Durante o trabalho de parto e na vigência do parto manter adequada hidratação e analgesia. A analgesia não deve comprometer o status respiratório, salientando-se que um controle insuficiente da dor pode ser o gatilho para desencadear o broncospasmo.

A hemorragia pós-parto (HPP) ainda é a maior causa global de morte materna, ocorrendo em 2,5 a 5% das parturientes. A HPP é definida pela OMS como perda de sangue de ≥ 500 ml dentro de 24 horas pós-parto ou ≥ 1000 ml após cesariana eletiva,60-62 embora diversas definições alternativas tenham sido usadas para descrever a HPP e sua gravidade.63-65

Porém estudos observacionais tenham sugerido que as doenças pulmonares tenham pouca interferência na HPP, um estudo de coorte, incluindo quarenta publicações, mostrou que houve aumento significativo de hemorragia no pré-parto e pós-parto, salientando que mulheres com asma moderada/severa estavam sob maior risco.66

Certas drogas de uso obstétrico merecem considerações. A prostaglandina F2a (carboprost – 15-metil-prostaglandina F2a) utilizada nas hemorragias severas do pós-parto devido à atonia uterina deve ser utilizada com muita cautela por causar broncospasmo e, se possível, evitada.36 As prostaglandinas E1 ou E2 utilizadas para indução do parto e dilatação do colo uterino são substâncias broncodilatadoras podendo ser utilizadas com segurança. Uterotônicos com metilergometrina (methergin) e ergometrina (ergotrate) no pós-parto podem causar broncospasmo, sendo a utilização da ocitocina (syntocinon) uma alternativa.

Como o risco de doença tromboembólica venosa pós-parto está aumentado naquelas com imobilidade, relato de viagens de longa distância antes do parto (mais de quatro horas), história prévia de TVP, trombofilia e obesidade, é importante que as gestantes sejam avaliadas quanto aos fatores de risco para se considerar a necessidade de profilaxia com heparina de baixo peso molecular.67,68

Se a tocólise se faz necessária, utilizar o salbutamol69 e o sulfato de magnésio70 por serem broncodilatadores. Outra possibilidade é o uso de bloqueadores de canal de cálcio, sendo a droga mais utilizada e estudada a nifedipina que apresenta potente efeito relaxante in vitro no miométrio.71 Entretanto, não em conjunção com o sulfato de magnésio – o que pode causar bloqueio neuromuscular. Efeitos adversos graves – 0,9% dos casos – têm sido relatados: infarto do miocárdio, fibrilação atrial, dispneia intensa, hipóxia materna e hipotensão com morte fetal.

A amamentação deve ser incentivada, não havendo risco na utilização de corticoides e ß2-agonistas por inalação, ou corticoides por via oral.72,73 Quase todos os medicamentos passam para o leite materno em quantidades habitualmente menores do que 2% da dose materna. Por outro lado, quando a mãe mantém no puerpério o mesmo regime de tratamento utilizado durante a gravidez, o recém-nascido receberá muito menos medicação pela amamentação do que quando da vida intrauterina. Deve ser lembrado que o risco de atopia em filhos de mães asmáticas pode ser reduzido com a amamentação. Este risco é de cerca de 1:10 quando só a mãe é atópica, elevando-se para 1:3 quando de casal atópico. A amamentação diminui os episódios de sibilância no início da vida do recém-nascido. No entanto, não preveni o desenvolvimento de asma persistente. Independentemente de seu efeito sobre o desenvolvimento da asma, a amamentação deve ser incentivada por todos os seus outros benefícios positivos.38

O alívio adequado da dor reduzirá a ansiedade e o estresse materno. A anestesia epidural precoce com anestésicos locais (com ou sem opioides) para a dor do parto é o método preferido porque reduz o consumo de oxigênio e a ventilação minuto durante o trabalho de parto.74 A analgesia peridural lombar pode ser estendida para uma anestesia segura e adequada no caso de uma cesariana de emergência, evitando assim a necessidade de manejo das vias aéreas. Se houver necessidade de anestesia geral algumas medicações são recomendadas: (a) como pré-anestésico utilizar atropina; (b) induzir anestesia geral com cetamina tem a vantagem potencial de prevenir broncospasmo;75 (c) utilizar anestésicos halogenados, em baixas concentrações, por inalação devido à sua atividade broncodilatadora e (d) assegurar após a extubação analgesia pós-operatória conveniente. Se ocorrer broncospasmo durante a anestesia administrar broncodilatador ß2-agonista no circuito de respiração anestésica.76 É comum aplicar 10 ou mais puffs de broncodilatador. A avaliação da droga administrada em um modelo de laboratório sugere que este método é eficiente.77 O monitoramento fetal contínuo deve ser realizado quando a asma é mal controlada ou severa.

A adrenalina não é recomendada no tratamento das exacerbações da asma na gravidez, pois causa vasoconstrição uterina e redução no fluxo sanguíneo uteroplacentário. A anafilaxia sistêmica durante a gravidez, trabalho de parto e parto pode ser catastrófica para a mãe e, especialmente, para o feto. Apresenta consequências clínicas dramáticas e potencialmente letais caso não haja reconhecimento imediato dos sintomas, tais como: dispneia, broncospasmo que podem ocorrer com opressão torácica e asma, além de choque.78 Nesta situação é a hipotensão arterial materna a determinante da má perfusão uteroplacentária em decorrência da liberação de mediadores com consequente vasodilatação e aumento da permeabilidade com extravasamento e perda da resistência vascular pela anafilaxia.79 Assim o tratamento não deve ser retardado utilizando-se a droga de escolha para o tratamento da anafilaxia que é a adrenalina intramuscular, que deve ser imediatamente administrada, minimizando morbidade e mortalidade materno-fetal.80

Não podem ser negligenciadas as comorbidades comumente associadas, incluindo a síndrome metabólica, diabetes Tipo 2, hipertensão, rinossinusite, doença do refluxo gastroesofágico, apneia obstrutiva do sono e hipotireoidismo/tireoidite de Hashimoto.

Algumas Estratégias para Melhorar a Asma na Gravidez

A prática de exercícios durante a gravidez é benéfica para reduzir a incidência de baixo peso fetal ao nascer e é provável que seja importante para a gravidez em mulheres com sobrepeso ou obesas.81

A exposição à vitamina D durante o desenvolvimento fetal influencia o sistema imunológico do recém-nascido, o que pode contribuir para a proteção contra desfechos relacionados à asma, inclusive infecciosos, no início da vida.82

Programas de abandono do tabagismo precisam ser incentivados, pois o fumo durante a gravidez está fortemente associado ao parto prematuro, baixo peso fetal, à função pulmonar anormal e a elevados níveis de IgE no cordão umbilical, à maior incidência de atopia ou asma na criança.83,84 Foram observadas associações entre a metilação do ácido desoxirribonucleico (DNA) em loci previamente ligados à exposição à fumaça do tabaco no útero e desfechos relacionados à asma.85 Um exemplo típico de tabagismo passivo é o do feto de gestante tabagista que tem seu desenvolvimento alterado, nascendo em média com 200 g a menos de peso, comparado aos filhos de não fumantes.86,87 Portanto, as mulheres devem ser estimuladas a parar de fumar e encaminhadas a programas de cessação do tabagismo cognitivo/comportamental. As grávidas também devem ser informadas de que a exposição gestacional à fumaça de cigarro ou ao fumo passivo promovem a transmissão transgeracional de asma alérgica exacerbada e displasia broncopulmonar.88 Outros membros da família também devem ser encorajados a parar de fumar ou evitar o fumo nas proximidades da grávida. Uma abordagem aos companheiros fumantes das gestantes merece atenção especial.

Estudos mostram que recém-nascidos de mães que fumaram durante a gravidez têm os mesmos níveis de nicotina que um adulto fumante e passam seus primeiros dias de vida em síndrome de abstinência, como se fossem viciados na substância química.89 Segundo a UCI TTURC (University of California, Irvine – Transdisciplinary Tobacco Use Research Center) após estudo prospectivo de 30 anos, os pesquisadores detectaram que crianças de mães que informaram ter fumado durante a gravidez têm o dobro de chance de se tornarem dependentes de nicotina na adolescência, quando comparadas às crianças de mães que não fumaram durante a prenhez. Estes resultados sugerem que o fumo durante a gravidez altera os receptores cerebrais do feto ligados à dependência da nicotina.

Associação entre Asma Ansiedade e Depressão

A gravidez representa uma fase de vulnerabilidade psicológica, mesmo para mulheres saudáveis. As mudanças anatômicas e fisiológicas junto aos sintomas na gravidez normal e os ‘medos' em relação ao curso da gravidez e ao feto em desenvolvimento causam estresse adicional. A ansiedade e depressão são comuns durante a gravidez (6 a 15%) com prevalência semelhante àquela das não grávidas.90 Na prática clínica, a depressão pode ser classificada grosseiramente como três padrões: depressão aguda, depressão aguda com recorrência e depressão maior crônica.91 As associações entre ansiedade ou depressão materna propiciam desfechos adversos na gravidez como: pré-eclâmpsia e risco aumentado para cesariana.90,92 Em mulheres com diagnóstico de ansiedade/depressão, as não tratadas tiveram maior chance para evoluir para cesárea eletiva em comparação com as mulheres sob medicação.

Referências

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